20071218

O que diz Courchene

Thomas Courchene pronunciou a conferência "The Federalism in the Mercosur: The Challenges of Regional Integration", no seminário internacional realizado em 2002 em Porto Alegre. Eu o entrevistei em Kingston em 2004, específicamente para uma pesquisa sobre a formação do Estado de Bem Estar no Canadá. A construção de um novo Estado de Bem Estar já se desenvolvia dentro da realidade de integração em regiões-mercados.

PhD em Economia por Princeton, Courchene, além de catedrático em políticas econômicas e diretor do Institute of Intergovernamental Relations da Universidade de Queens no Canadá, é autor de 250 artigos que vão da politica econômica à monetária específica, voltados para o Canadá e sua inserção na América do Norte. A partir de 1998 iniciou comparações internacionais sobre federalismo, e é conhecido mundialmente.

Seu livro de 2001, A State of Minds: Toward a Human Capital Future for Canadians passa à dimensão de avaliar a formação de capital humano dentro de regiões de integração em cenários de abertura de mercado e globalização.

A primeira importante constatação é a de que contrariamente ao senso comum, os processos de abertura e liberalizaçao, não atendem somente interesses de maximização de lucratividade de produtores e grupos empresariais negociais, porque trazem junto a base civil e o processo na cidadania. E é isto que ele demonstra pela lógica dos próprios processos de integração, pois todos eles estão inseridos dentro de sistemas federativos.
A era da informação transformou o papel dos cidadãos, mercados e governos com inter-relações entre eles. Faz uma citação de Manuel Castells para dizer que há espaço de "locais físicos" e espaço de "fluxos' e isto não tem sido levado adequadamente em consideração.
Agentes sub-nacionais,como governos estaduais, aumentam seu comércio com outros agentes similares e passam cada vez mais a constituir regiões integradas com suas inter-exportações e importações, criando jurisdições.À medida em que cresce este volume de comércio,ele ultrapassa intenções iniciais dos governos federais, assim com dos agentes privados participantes dele. Há todo um conjunto de corredores produtivos que se estabelece, com motivações, intenções, proporcionalidades.Isto tem efeito sobre o próprio federalismo interno.

No caso canadense, o efeito demonstração do acordo de livre comércio do Nafta foi tão poderoso, que gerou entre as provincias canadenses ampliação de trocas comerciais internas que as fizeram baixar ainda mais qualquer barreira que ainda pudessem ter entre si - reforçando, ao invés de fragilizar as instituições nacionais.

O que ocorre é que estas instituições não ficaram mais localizadas no plano federal , mas sim no federalismo inter-provincial. Mudanças de impostos foram programadas para atender maior eficiência ao fluxo de comércio entre as regiões, visando passar do imposto de renda para o consumo, e de valor adicionado.
(O Brasil, por exemplo, teria instituições já preparadas para este federalismo inter-estadual, como o Conselho de Desenvolvimento do Extremo Sul, junto com o de outras regiões como Nordeste, Centro-Oeste, embora as diferenças de federalismo com o Canadá).
O mais importante foi a subsidiariedade e divisão de poderes. O processo de transferência de poderes gerou a glocalização, conceito desenvolvido pelo próprio autor.

Significa que enquanto se foi transferindo poderes a estruturas supranacionais em alguma medida, mesmo que cautelosamente, na forma de conselhos de mercado, houve transferências internas de poderes ao setor privado de atividades antes ocupadas pelo setor público, e grande disseminação do acesso a tecnologias de informação. A racionalidade no principio de subsidiariedade tornou eficiente o local de geração de serviços mais próximo das comunidades afetadas pela ação, descentralizando operações.Uma vez que um dos fundamentos da globalização é a ultra-mobilidade, ao mesmo tempo se formaram niveis locais e regionais de grande eficiência, aglutinadores de atividades sociais, econômicas e culturais.

A glocalização implica em outros níveis de representação, e auxilia também a formar cidades globais, com grande capacidade de reunir atividades e difundir conhecimentos, e com constitucionalidades próprias. Isto ocorreu com Montreal, Toronto e está ocorrendo com outras cidades canadenses que vão formando os Estados-Regiões - porque se integrando com Estados nacionais limítrofes em suas trocas.
Os cidadãos emergem como principais atores deste processo ao organizarem-se como reivindicantes diretos desta participação constitucional, visando novas formas de representação.

Courchene afirma que no caso do Mercosul, Brasil e Argentina devem somar políticas fiscais de ajuste para realmente conter históricas atitudes permissivas, favorecendo emergência mais rápida do paradigma da integração competitiva que beneficia novas regiões dentro da formação geral do Bloco.

A formação de União Social seria mais complicada do que a que ele relata ocorrida no Canadá, país que apesar de abrigar diferentes nacionalidades - especialmente franco e anglo descendentes - tem já constituída uma federação como Estado desde 1867. Possibilidades de reforçar vínculos em saúde, educação, assistência social, podem advir de constantes "efeitos demonstração", troca de experiências nos níveis locais e sub-nacionais.
São condições que formam sustentação de capital humano.

A íntegra da conferência de Courchene in