20071203

AFINAL, O QUE É O "SOCIALISMO DO SÉCULO XXI? "



O socialismo do século XXI, tal como delineado pelos seus formuladores na Venezuela - e Herman El Trudi, principal assessor teórico de Chavez neste momento é um deles - prevê necessidade de cobertura da informação em todas as linhas e níveis. Sobre o quê produzir, como, quando, onde e porquê. Célebres perguntas que são elementares por exemplo no jornalismo, mas que desenvolvidas, tornam-se também auxiliares de problemas de pesquisa.Sobre tudo o que se produz e consome, e se pode distribuir.Afirma-se que o objetivo explícito é preparar a sociedade para a autogestão, o que aparece na obra Nos invitaron a debatir sobre el socialismo del siglo XXI, série debate 1, El nuevo modelo productivo socialista,Caracas: 05.12.2006
O autor cita István Mészaros, o professor húngaro radicado em Sussex,
na Inglaterra e discípulo de Georgy Lucács, autor de Para Além do Capital ao dizer que o sistema comercial "necessita extinguir-se à medida em que outro ocupe seu lugar, e que a comunidade em seu nível local deve ser regida por valores de uso e não de troca".

Para realizar esta transição, há também citação de alguns repetitivos slogans já conhecidos de militância no trabalho, onde se afirma que formas de organização velhas convivem com a nova ordem, ou seja, formas capitalistas convivem com novos modelos de sociedade, e o terreno super estrutural de uma nova consciência com um plano material a revela com novas relações sendo capaz de elevações desta consciência, através de uma constante educação universal na batalha de idéias. A solidariedade deve prevalecer sobre interesse.
As empresas estatais, por exemplo, são vistas como tendo relações mercantis e produções fordista e taylorista que não visam satisfações humanas, e por isto devem ser induzidas a comprar insumos de fornecedores não mercantis como cooperativas, e desenvolver programas de responsabilidade social.
Já as empresas privadas têm uma lógica de competição. O Estado deve primar pela eficiência social, e como as empresas privadas beneficiam-se de tarifas, subsídios do Estado, este deve exigir-lhes responsabilidade social, participação acionária dos trabalhadores, compromissos ecológicos, co-gestão, articulação com cooperativas, e ajuste do nível de lucros e repartição,
O capital internacional não-produtivo de rendas deve ser coagido com greves, pressões sociais e paradas comunitárias.Já os bancos e o comercio importador, no período de transição, devem enfrentar o banco estatal, pois o comercio importador enfrentará principalmente a substituição de importações.
Há um setor previsto constituído de empresas de produção social.
Um Fundo de produção social é obtido através das relações das grandes empresas estatais com seus contratados terceirizados, que já prevêem em seus contratos montantes como previsões para o fundos de planos sociais. Empresas de produção social são passos adicionais às cooperativas, mas os formuladores não as consideram socialistas e sim formas de capitalização.
Conselhos comunais e conselhos locais de participação publica passam a ser executores destas negociações.
As empresas de produção social mantém características de sociedades anônimas, e estariam à procura de uma definição precisa para uma mudança no código comercial venezuelano.
As cooperativas continuam existindo, evitando segundo os formuladores, toda a sorte de distorções no cooperativismo, inclusive patrões e empregados que se regulam por cooperativa. Gera-se seção de crédito por grupos de atores, como Banco do Povo, Banco da Mulher. Acompanham uma Superintendência Nacional de Cooperativas.
Um Plano Nacional de Produção, então, através das necessidades setoriais, desemboca numa centralização, onde o gabinete Econômico é a instancia máxima.A produção por metas é estabelecida segundo regiões e setores.


Substituição de Importações
O diagnóstico é o de que não existe na Venezuela empresário nacional autônomo, mas dependente de subsídios do Estado.E a supervalorização da moeda induz importações.Produz-se muito poucos bens e serviços, e se produz segundo a pauta de um mercado global neoliberal.Deve-se portanto comprar dos produtores nacionais, mesmo que mais caro.E comprar à vista dos agricultores venezuelanos. Estabelecer empresas mistas com paises aliados, e constituir empresas bipartites entre empresários e Governo.


A educação
Com desenvolvimento e brigadas de voluntariado diz-se que aumentou a possibilidade de prover educação, e os formuladores afirmam que possibilita organizar-se uma cultura de credito popular em caixas de poupança, fazendo a educação auxiliar a economia
(Aqui um comentário: o que apoia a educação de Chavez são as missões educativas, que se constituem em programas sociais para grupos excluídos, que provêem uma bolsa mensal de U$ 100 ao participante para aprendizado. Desde 2000, criou-se a figura do supervisor itinerante, que deveria intervir em escolas públicas e privadas, nomeando e removendo diretores - sendo escolhido por ministros e causando ampla rejeição em grupos de pais, famílias e centros de vizinhanças). Em setembro deste ano, Chávez anunciou um novo projeto curricular chamado "sistema educativo bolivariano" que deve dar ênfase total em marxismo leninismo a partir do terceiro ano do secundário e filosofia que Mariano Herrera, reconhecido especialista em Pedagogia do Centro de Investigações Culturais e Educativas chama de "filosofia militarista e belicista" no quarto e quinto anos secundários. Os resultados educacionais, porém, que são o que importa, indicam repetência idêntica nos últimos cinco anos e deserção. As provas de compreensão de leitura e matemática mostram paralisação no nivel de aprendizagem do alunos das escolas públicas. Há cinco mil escolas bolivarianas entre um total de 24 mil escolas publicas no País, que recebem atenção mais dedicada.
O grande modelo altamente polêmico de fiscalização permanente, ditatorial
Reformar a divisão político territorial venezuelana, através de um sistema nacional de planificação participativa, que segundo os teóricos, visa dinamizar a produção nos 335 municípios.Segundo esta visão, o que se quer é repensar o território, o repovoando, zonificar grandes cidades, fazendo os agentes assumirem responsabilidades locais, municipais, nacionais, regionais e mundiais.Pensando então em fusionar, e simultâneamente desagregar. Com isto se cria polígonos produtivos. Estes polígonos sócio geo-culturais têm cada um espaços de unidade, a partir dos quais se criam coletivos locais, baseados na unidade cultural, social, territorial, produtiva, étnica.Um âmbito de competências publicas, como junta paroquial, alcadia, governação, e um espaço territorial como paróquia, município, estado em vários poligonais. Planifica-se a partir dos referentes locais.Argumenta-se que há abertura participativa construída desde a base.
Segundo esta visão a comunidade política é limitada pela territorialidade.Sua fundamentação máxima é o Holismo. As poligonais se articulam entre si, com planos,programas e projetos.
E a diminuição da jornada de trabalho é considerada uma condição para a formação de trabalho e geração de emprego.
O resumo destas proposições indica a reiteração persistente de categorias reducionistas de como se organizam associações e cooperações que presumem ações econômicas, visando maximizar resultados sociais.
O pressuposto da disciplina pela coerção, ao invés de facilitação do Estado como agenciador de recursos e prêmios por reduzir cadeias de custos de transação reduzindo incertezas, supõe um aumento e oneração dos agentes econômicos. Isto tem consequências sobre a produtividade. As diversas comunidades que se supõe interatuantes só o podem fazer como comunidades de comunidades, se sentirem estimuladas a graus menores de coerção para desenvolverem maiores confianças investidoras e reforçarem suas instituições.
As proposições de articularem de forma inovadora, empresas sociais, presumivelmente terão pouca eficácia em um ambiente coercitivo e supervisionado com vigilância pelo Estado, tendendo ao clientelismo de prebendas. Nao é de uma ampliação de sociedade de sociedades que se está tratando, nem de comunidade de comunidades, que caracterizaria um capital social societario de grande amplitude.Mas sim de formações comunais, que reportam a uma hierarquia aglomerativa, em primeira instância.E agregativa, nas instâncias mais adiantadas.

Sem a representação qualificada, a especificação e realização do capital cultural fica completamente prejudicada para ampliar redistribuição de capital social.
E qualquer forma de socialização ampliada que resguarde conquistas fundamentais da democracia, é obscurecida.
Neste sentido, há muito pouco de século XXI nestas formas societárias.As experiências corporativas são do início do século XX, e a subsidiariedade de soberania pretendida sobre a Nação,com o regente outorgante de ações comunais através de delegados nas localidades é uma antiga ordenação de similaridade da ordem regencial hispânica de natureza inquisitorial, onde portarias e decretos se faziam por mercês.
Como examino adiante, pesquisas sérias sobre transformações sociais hoje levam em conta a crescente diversificação cultural que toma forma de multiculturalismo produtivo, onde a comunidade pós-industrial se ampliou, avançando produtividades diferentes, e reunindo novas formas de solidariedade. Nos casos específicos de países retardatários, a formação de capital social nas comunidades em momentos diferentes, com suas características próprias, tem valorizado ampliação de economias federadas.
SOBRE A OBRA DE MÉSZAROS E SEUS EQUÍVOCOS  Mészaros, István Para Além do Capital. São Paulo, Boitempo/Unicamp

O autor Istvan Mészaros é fiel às primeiras definições de Marx entre relações, integrações e combinações entre determinações naturais, relações produtivas, transformações sócio-metabólicas(como nos escritos de a Ideologia Alemã), e suas relações variáveis hierárquicas que atingem modos da produção. Supondo então maximizações constantes de formas de valor entre uso e troca, em generalização de produção de mercadorias.
Um estágio combinatório superior de produção de mercadorias e uma desvinculação entre esferas fariam a produção de valores de troca não depender das funções de Estado em fase de controle generalizado, alcançado um circuito de realização independente dos agentes que o constroem, como os sindicatos de trabalhadores, na concorrência inter-capitais, precarizando relações e as possibilidades de emancipação social.
Esta argumentação, embora mais completa do que apresentada por dissidentes da social democracia do início do século XX, como Rosa Luxemburgo, que via tendência à concentração monopólica, é antiga e pouco inovadora ao papel do desenvolvimento tecnológico como visto por Joseph Schumpeter. Este verificou claramente concentração e logo capacidade redistributiva em consumo dos ganhos auferidos pela variável tecnológica, aumento da escolaridade generalizada e diminuição de competitividade acentuada direta inter-firmas com crescimento de outros níveis de cooperação pela abertura de mais espaços na sociedade civil, com diversificação de ramos - novas gerações de atuação visam diminuir custos, com isto aumentando aprendizados que sustentam produtividade constante não mais alicerçada em capital físico, em equipamentos. Ativos humanos tornados capital constante de vasto setor de serviços, geraram novas qualificações, educação, compreensão e valor adicionado, foram progressivamente substituindo a antiga “previdência por repartição”, pela capitalização.

Implicaram, então em uma redistribuição do investimento social.
Há redistribuição de atividades entre sociedades mais complexas e menos complexas, provocando nestas a intensa modificação de aprendizado e uma integração de conexões produtivas, capital social em redes formadas introduzindo conhecimentos convergentes e níveis mínimos de remuneração pela produtividade que aumenta e busca também convergência. Com certeza, existe concentração relativa, o que é muito diferente de falar-se em concentração absoluta, e em outro momento do ciclo, nova diversificação e redistribuição.Mészaros não conhece paradigmas de equilíbrio dinâmico, com os quais trabalham tecnologias de grande densidade,oriundas de novas invenções, sua socialização e principalmente os investimentos que antecipam estas tecnologias.Brian Arthur as vem estudando desde 1990, em Santa Fé.


Nada disto a teoria marxista tradicional de Mézsaros prevê, antevê ou sequer se questiona. Parte dos mesmos pressupostos e de uma teoria de objeto que fundamentalmente é estática no marxismo objetivista-positivista na relação de sujeito que se objetiva por facticidade dada, e que não apresenta potencialidades entificadoras. Isto é, relacionais pelas capacidades diferenciadas do sujeito em relação que desenvolve grupos diferenciais, escalas atributivas, utilidades marginais e distribuição até o máximo de geração decrescente por unidade aplicativa, e que nas novas tecnologias socializadas encontra retornos crescentes. Por isto comete equívocos inevitáveis.Tais como atribuir “deslocamento para esfera de troca da esfera de valor”. As composições de representação e capital como atribuições para reinvestimento em circularidades crescentes, mesmo abstratas e sua volta a circuitos produtivos, são gerações com representantes de corretores específicos para isto e não são deslocamentos definitivos.
A concentração é parte de um ciclo curto, de realização de valor até sua nova aplicação.Leva em média de cinco a nove anos. Mezsáros toma este ciclo por constante.

A conseqüência desta epistemologia e hermenêutica é induzir ao reducionismo categorial de consciência e representação de classe, que Karl Mannheim já havia observado em 1928, seja em "Ideologia e Utopia" e mais tarde em " Sociologia da Cultura", uma alienação típica de falsa “consciência objetiva” do portador da consciência operária como representante de suposta ideologia total , que faria a grande revolução conceitual e aplicada da estrutura social.
Embora não conhecesse Antonio Gramsci, Mannheim e seu paradigma de perspectiva relacional de objeto genético, trouxeram condições de reflexão sucessiva interagente como argumento científico fundamental. Discriminador de dimensões e atribuições de sentido em contextos e ideologias políticas, orientou a partir de então a construção combinatória de sentidos integrativos de campo e solidariedade por oposições que visavam se complementar. Noções de hegemonia com dominâncias tornaram-se irrelevantes para a compreensão da superação do reducionismo da luta de classes na sociedade civil. Esta última é localizada e momentânea, pois a pressão por conhecimento faz integração superior, reespecializando consciências e foi isto o que Mannheim chamava de "inteligentzia"
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estratos combinatórios de classe que superariam o dilema de classes irredutíveis formando blocos e campos intransponíveis onde um prepararia hegemonia seguinte para destruir o outro.
Acostumados ao defasado modelo explicativo do marxismo estrutural, ao gramscianismo passivo de movimento e outras aplicações de noções sem nenhuma discriminariedade empírica refutável ou argumento expositivo detalhado de teoria social, ativistas lançam-se à guerra de posições e movimentos supondo modificar naturezas e composições de Estado.

Desrespeitando elementares regras de composições e negociações entre atores políticos, que se organizam segundo novas subsidariedades diferentes das teorias de monopólio e formação de preço dos anos 1910 a 1927. As interespecializações produtivas e espacializações diferentes na Alta Modernidade, têm criado aumento de escolaridade em todo o planeta, convergências de preço com estabilidades, e competições intra-corporações impensáveis nas primeiras décadas do século XX. Invenções geradas por novos agentes de setores mais avançados desestabilizam acordos cartelizados intra-grupos, e forçam aberturas de mercado.
Houve regressão no periodo recente de guerra no Iraque, onde esta geração de inovações foi apropriada para tecnologias do Estado Industrial-Militar, ressuscitando protecionismo conservador. Mas o quadro da pequena firma em competição com o grande grupo industrial que se financeirizava quase desapareceu. Foi trocado pela disputa de grandes grupos representantes de acionistas, investimentos e geradores de tecnologias (contendo vasto setor de empresas fornecedoras e compradoras com o qual precisam ter responsabilidades corporativas) contra os antigos conglomerados financeiros-seguradores. Os primeiros representam novas fronteiras de conhecimento.
Este conflito é o principal do século XXI, e como tem relação somente indireta com empregos gerados por fornecedores e grupos dependentes de sua ação, é visto errrôneamente como "capital abstrato ou fictício".Em verdade, o capital social gerado nesta ação pelos empreendedores tecnólogos - em biotecnologia, informação, novos materiais, entre outros - visa desobstruir e transformar produtivamente o interesse de rendas patrimoniais presentes, que está impedindo formação de ciclo longo sustentado e redistributivo de prosperidade social.